Homem altar

O sagrado

Acontece dentro do homem

Quando externado

Torna-se chave

Para os portais do divino

E o que o encanta

Tornará em sacro abrigo

Qualquer lugar nos mundos.

Casciano Lopes

Instalação do Eu

Somos
Fragmentos de um todo
Retalhos de história
Pedaços de outros tantos
Paisagens distintas
Uma coletânea de homens
Uma estrada de tempos
Um hoje cheio de intensos
Ontem e amanhã diversos
Coroa e súdito
Semelhanças e diferenças
Somos
A soma dos cacos
Os fortes e fracos
Do espelho que nos vê.

Casciano Lopes

'Diferentes espelhos'

Prisma sarado

O olhar pode

O rumo reverter

E obstáculos mover

Basta além de olhar

Ver.

Casciano Lopes

Plateia é detalhe

O que canta nossa existência

está muito mais na partitura

da alma que na garganta do corpo.
A estrada sempre sabe mais que seu viajante.
A melodia só é afinada

quando somos emissores e receptores

do próprio canto.

Casciano Lopes

Dualidade

Há dois tempos

Duas luzes

Duas cores

Dois momentos

Duas certidões de homem.

Casciano Lopes

Meus anos

Fiz o que pude

Talvez não tanto quanto gostaria

Talvez menos muros pulei e mais pontes cruzei

Ou o contrário

... Mais, menos

... Pontes, muros

Pudera eu voltar

Pular, cruzar

Fiz.

Será?

Farei descansar meus impedimentos

Quando em breve meus 51 chegar.

Pois em mente onde o meu coração agora está

Sem muros, pular não há.

Casciano Lopes

Por onde anda a calma?

Foi no topo das montanhas

Que descobri que eu poderia ser ventania

Mas na escalada precisei armazenar brisa nos pulmões

Até para ser tempestade precisamos conhecer a calmaria.

Casciano Lopes

O cara de dentro

Sabe que sorrir é cartão de visitas

Que olhar vai além das vistas nubladas

Que conhecer lugar de fala é tão importante

Quanto lugar de ver e lugar de escuta

Que músculos podem falhar

E o 'acreditar' nunca...

Que a vida é cara e rara

Que vai além da matéria

E que a evolução é conquistada

Com a força do 'sim eu posso'.

Casciano Lopes

Exposição

O amor é coisa de galeria
Passeia corredores de artistas
Expõe almas nuas em telas caras
Pincela sentimentos raros com tintas únicas
E esculpe em mármore como se papel fosse
Sua marca é indelével ao tempo e não raras vezes
Faz morada em museus para contar sua força.

Casciano Lopes

Céu

Até pra espantar a noite chamam o azul.

Casciano Lopes

Casa de alfabeto

A casa deve ser poesia

Sagrada como tal
A rima vem na verdade
Os versos contam histórias
Um lugar onde dançam:
Letras
Palavras
Frases inteiras
E sua forma de dizê-las.
O livro acontece

Chão e telhado são capa e contra capa

E as paredes...
Construímos em capítulos,

O acabamento e sua decoração

Declamamos ao longo do poema viver.

Casciano Lopes

Lugar de ver

Na teia da vida
Somos o fio que liga
Presa e caçador
Um universo de encontros
Um labirinto
Uma busca
Um olhar chegado
Um alvo, um foco
Um lugar nos mundos.

Casciano Lopes

A idade da observação dos movimentos

Chegamos à vida com malas vazias, não prontas.

Ao longo das vivências de cada viagem, acumulamos suvenires.

Mais tarde precisamos trocar itens maiores por menores, alguns mimos precisam ser substituídos ou eliminados. Necessitamos espaço.

Na primeira etapa subestimamos a bagagem, dá-se um jeito, socamos na mala sempre um pouco além.

Guardamos falas, atitudes e são imensos os catálogos de cada experiência... Nossas e dos que nos cercaram, dos que nos facilitaram travessias e dos que impediram nossos saltos.

Mágoas e rancores tomam espaço fenomenal!

Na última etapa da vida, na reta final da viagem, perto do destino, é preciso liberar espaço, o excesso de bagagem impede o carimbo no passaporte.

Os mimos que colocamos na mala, então, deixam de ser espaçosos e pesados.

Passamos a catalogar olhares e gestos, são mais leves e dignos de armazenamento.

Descobrimos, por exemplo, que o riso e a gratidão validam a passagem, que os abraços seguirão no peito e fora da mala, que o amor incondicional impulsiona as rodas do transporte sem gastar energia poluente, que os largos ou contidos movimentos feitos no silêncio da verdade são admirados pelos condutores do veículo, que a generosidade paga o bilhete do embarque e que a vista do caminho deixa de ser turva quando espalhamos e não juntamos... Seja na mala da vida ou na viagem concluída.

Casciano Lopes

Correio lavado

Em dias de saudade,

a gente manda carta molhada,

assim a poeira da estrada gruda

em assinatura conjunta.

Casciano Lopes

Memórias...

A gente leva tudo no carrinho de mão do coração.
A gente caminha movido ou se move por elas?
Na verdade a gente só carrega o que quer de novo encontrar.
Por isso se destina em passos.

Casciano Lopes

Residência de carne

Moro com eles
Todos me habitam
Vestem meus corpos
Despem minha coragem
Deixa nua a vontade
Enquanto agasalha a luz.

... De onde vim
Pra onde vou...

Vão todos
O medo e o ímpeto
A fé e a descrença
A graça e a falta de tintas
A máscara do riso
O borrado choro.

Casciano Lopes

Cíclica relva

Que sempre paire o recomeço,

assim como o dia

que desbrava o ontem anoitecido.

Casciano Lopes

Humana santidade

A vida é milagre.

O homem muitas vezes

é o santo milagreiro.

Casciano Lopes

Perfume

Há que sentir toda forma de amor,

dizer é bem pouco diante de um jardim em flor.

Casciano Lopes

Aprecie a viagem

Que saibamos contar os milagres do minuto

instante,

com intensidade vivendo o segundo

marcante,

pois todas as horas passadas são feitas deles,

uma grande praia com seus grãos infinitos de areia

distante.

A vida é uma linda vista que se move,

uma paisagem que não morre nunca.

Casciano Lopes