29.11.13

Não são matas fechadas

O que mapeia nossas estradas
E que norteia a caminhada
São os arbustos voluntários das margens
Corados, desbotados ou empoeirados

Cumprem a missão de marco
Pontos de partida para quem chega
Pontos de parada para quem vai
Na margem está a direção, todo o tempo.

Casciano Lopes

Nada de Brasília

Se a felicidade pode estar em qualquer esquina
Quero vida em vias de intersecção.

Casciano Lopes

Depois do querer

Te quero porque não aprendi desquerer
Te espero porque não posso só morar
E se amo tanto, inda mais amarei
Porque desamar é delonga
E sou de pressa como o amor
Que depressa se apodera de quem aflora.

Casciano Lopes

21.11.13

Eleito

Quando um rio atravessa a cidade
Ele é quem a administra.

Casciano Lopes

Talvez...

Talvez a vida reduza a marcha
e do fim seu emissário perca caminho
Talvez se alonguem os braços e seu mar
E a tempestade não faça de tudo descaminho.

Casciano Lopes

Poesia na estrada - II

Já escrevi pra Antonia, Rafaela e Raimunda
Pra Casemiro, João, Batista e José
Mas gosto mesmo é de escrever pra rua
Nela passam todos...
Próprios, comuns, substantivos e adjetivos
Também é na rua, na estrada como digo
Que moram os ninhos onde choco minhas letras.

Casciano Lopes

19.11.13

O que fora vendido

Chega puro
Cresce duro
Amadurece
Apodrecido
Envelhece
Parte velho
Empobrecido
Cada homem
Comprado.

Casciano Lopes

Procissão

A cobra imensa vai engolindo a multidão
Debatendo-se feito viva lacrimeja suor
Rastejando o corpo longo feito de chão
Vai o círio calado em busca de confessor

Cultuada peçonhenta serpente da servidão
Que junta no aperto calcanhares de sonhador
Serpenteando pedidos em meio a exaustão
Grita um Nazareno no afã de seu odor

Silêncio comungado em resmungada confusão
Entorpecente veneno que mata o descobridor
Despe enquanto cala cada homem histrião
Enquanto foge da morte pobre, o seu autor.

Casciano Lopes




11.11.13

Há dias impossíveis

Calvos dias, sem penteados possíveis
Sem face para maquiar.

Casciano Lopes

Chão partido

Quebrou no mar lá da vida
Foi para as bandas do coração
Quebrou na sala lá de casa
Estrondoso e fino como um grito
Tilintou nas esquinas de meus cômodos
Sem cerimônia adentrou nos surdos de meus silêncios
Rompeu os tímpanos da lembrança
Quebrou-se
Desfez-se
Era laço com mania de nó
Um apego atrevido desmemoriou-se
Quando desfez-se a cadeia de seus átomos
Espatifou-se
Patifes cacos rompendo meu chão em cristal quebrado.

Casciano Lopes

Indolente


Quintais e varais


8.11.13

Ouça o bom conselho

Não é necessário morar na floresta
para que o verde te abrigue
Não precisa ser vizinho da cachoeira
para que as gotículas frescas te adornem
Não há necessidade de construir asas
para atravessar trópicos com os pássaros

Basta tão somente
Semear todos os dias
Janelas e portas abertas
Regar pontes
E não temer colher a travessia.

Casciano Lopes

Mundana intempérie

Não posso me debater nessas águas
Densas e turvas com resto de chuva
Nem peixe sou, nem lampejo de trovoada
Nem calçada, nem rua, nem mata fechada
No máximo um humano sem barbatanas.

Casciano Lopes

6.11.13

Zero

De amanhãs
Ontem já não sou

Melhor mesmo é hoje
Já que dependo de termômetro

Cronômetros zeram com eles...
Com os amanhãs, os termômetros e meu pouco ser.

Casciano Lopes

O meu sétimo é domingo

Entre a tristeza e a alegria
Não existe nada além de um coração

E porque domingos são sorridentes
O meu é cheio de domingos.

Casciano Lopes

Mensageiro dos Tempos

Gastos dias que me consomem
Todos eles parecem ter dentes afiados
Relógios amolados no esmeril da pressa
Alicates que tosam antes que cresçam,
que amadureçam ideias.

Gasto tempo, tão velho quanto o próprio
Tão insalubre e sem adicional de periculosidade
Virtuoso quando chega e quando se vai
Esvai-se vertiginoso,
enquanto deixa acamado o próprio templo.

Casciano Lopes