11.2.22

O menino e a jaca

Eu tinha qualquer coisa entre seis e sete anos,
e era uma das tarefas levar almoço pro meu pai na roça.
Coisa de quilômetros poucos,
só o suficiente pra aumentar o peso do picuá
(branquinho alvejado, nascido de sacos de mantimentos).
É, a estrada tinha costume de dar ganho de peso,
como se desse sustança ao alimento viajante.

Um dia comum, voltando do exercício,
os olhos correram pra um pé de jaca e criou vontade.
Me aproximei, pedi ao Henrique (filho do administrador),
se poderia levar pra casa a bitela jaca caída aos pés...
Minha mãe amava jaca, e eu as duas.

Consentimento dado e com a jaca doada,
precisei da força do contentamento pra suspender a exagerada.
Nesse dia o caminho fez a graça de se estender.
E se não fosse o cheiro da fruta animando os passos, nem sei...

Chegando próximo do alpendre da casa de alegrias,
gritei como quem vence uma guerra: - Mãeeeeeee!
...Talvez tenha sido meu primeiro contato com a canseira.

Mesmo orgulhoso que estava, pude ouvir minha mãe perguntar:
- Que é isso, menino?
Expliquei e continuei orgulhoso.
Foi quando recebi da grande Mestra a maior lição de todas,
afinal, tive a honra ne nascer de sábia e a jaca foi instrumento,
foi sabedoria em cima do suor menino.

Em tom de doutrina inflamada, disse:
- Você nem entra. Vai voltar agora no seu próprio rastro,
e vai devolver essa jaca no pé da árvore que achou. E se
o Henrique estiver lá ainda, vai se desculpar e dizer
que na sua casa tem o que comer e que foi feio o que fez.
Quando voltar a gente termina essa conversa... Arreda pé, menino!

Bom, a tal conversa dispensa prosa aqui.

A estrada e sua distância até hoje fazem o caminho da roça
dentro de mim... Só sei que jamais esqueci
o cheiro da jaca, o peso de um picuá e a conversa com a sabedoria.
Devo minha riqueza por ter quilômetros caminhados
entre ter honra antes de ter fome.

Casciano Lopes





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