Sou eu, a busca por mim que me insere todo dia na jornada e que me investe de curiosidade, me tornando capaz mais do que suponho, que move meus passos e torna meus braços aptos, apesar das noites que teimam em esconder os dias.
29.1.24
Quimera
É solitário o caminho e, no trajeto, vez ou outra, encontraremos burburinhos e aglomerações que passam... porque nos nossos desertos nos tornamos inóspitos e, nas miragens de água, nos enxergamos potentes.
Lá no oásis final, no grande portal, o que não será alucinação foi o tempo gasto com o caminho; seco ou não, abastado ou diminuído, mas sozinho... Será verdade o passo, o traço feito, o laço dado no cantil em volta da cintura, que não perdeu a sede quando não foi delírio.
Todos temos
A sombra que também é minha,
fica contida entre a dúvida e a certeza,
me provocando desejos que nem sei se são meus.
Casciano Lopes
fica contida entre a dúvida e a certeza,
me provocando desejos que nem sei se são meus.
Casciano Lopes
Nota de falecimento
Morre pelo caminho...
A pele todos os dias
A paisagem que corre
A vontade que muda
A flor que cumpriu ser
A essência do perfume
A promessa da boca
A palavra quando emudece
... Morrem
Pessoas vivas e mortas, despedidas todos os dias, partidas de dor, da dor, de alegrias...
Partida é morte todo dia. Pequenas e grandes juras também partem, também morrem, o nascimento é coisa que morre, enfim, está tudo bem, desde que morra em mim a exigência de eternidade aqui, no mundo da perenidade; morremos todos de alguma forma, todos os dias.
Casciano Lopes
A pele todos os dias
A paisagem que corre
A vontade que muda
A flor que cumpriu ser
A essência do perfume
A promessa da boca
A palavra quando emudece
... Morrem
Pessoas vivas e mortas, despedidas todos os dias, partidas de dor, da dor, de alegrias...
Partida é morte todo dia. Pequenas e grandes juras também partem, também morrem, o nascimento é coisa que morre, enfim, está tudo bem, desde que morra em mim a exigência de eternidade aqui, no mundo da perenidade; morremos todos de alguma forma, todos os dias.
Casciano Lopes
A cabeça ajuda
A agonia não tira você do buraco, ao contrário,
ela aprofunda a cova e te sepulta vivo num processo claustrofóbico.
O segredo é cuidar do pensamento em superfície,
O segredo é cuidar do pensamento em superfície,
mas com a pá nas mãos, e ao menor sinal de aterramento, cavar.
Casciano Lopes
Casciano Lopes
Cuidado descuidado em silêncios resmungões
O agressor da rua não me conhece, não viu meu sorriso e nem riu da minha cena, não decorou meu texto, não sambou o meu enredo, não desmontou o palco de nenhum dos meus espetáculos, não montou a lona do picadeiro, não pintou meus olhos quando precisaram engolir o choro e, na avenida, quando o salto quebrou, nem de longe viu.
E talvez, no grande circo, por tudo isso, a face fica borrada é dentro da coxia, entre os pares, perto dos corações selvagens, que deveriam conhecer de harmonia pra que a concentração, antes do tempo, não se torne dispersão. ...e talvez a graça não precisasse sentar pra chorar.
27.1.24
Entre dois pontos
Quando passam os dias fazendo barulho em minhas janelas, só penso que, como um trem, haverá uma estação de desembarque, e eu, passageiro que sou, viajo tranquilo então, sabendo que lá haverá uma plataforma com seus pombos e guardas, pessoas trocando apertos de mãos... Sei da faixa amarela, mas também sei dos trilhos que trazem pra perto o que precisa ficar e levam o que preciso deixar ir...
Tem algo musical quando vagões tocam um 'si' nas chegadas e partidas, quando já em mim caído, me rendo ao destino.
Casciano Lopes
Guardião
Sou um privilegiado
e não há ocasião
que me arranque o que herdei do tempo,
não por merecimento,
mas por cabimento
nessa experiência humana.
Casciano Lopes
Vejo um mundo
Sou um devoto do olhar que me foi permitido, não deste adoecido, e sim, do que enxerga por entre as frestas, do que consegue entre sacolejos, equilibrar o retrato do que importa, deste que apesar dos terremotos e sem a arquitetura graduada, consegue reerguer a cidade e colocar bancos na praça, pra neles se sentar e contemplar o vento que sopra a sombra, fazendo clarear as calçadas com seus passarinhos.
Em tempo
Sobretudo saber que o tempo não é coisa de se contar em horas ou dias, ele gosta mesmo é de ser dito sem relógio pra demorar passar e com a pele arrepiada de quem conta, sem pressa, o que fez dele.
Amanhã dependerá
No ano passado, ontem, na semana passada, ontem, no mês passado, ontem, passado...
Não posso viver lá e nem querer que aquele sol entre pela vidraça e perfure de luz a cadeira da mesa da sala, banhando de dourado a cena com as pessoas sentadas nela... cena.
O ouvido não pode se perder caçando as risadas soltas entre juras e promessas de 'para sempre'.
A boca não pode viver cantando aquela canção sob a pena de esquecer o que nem aprendeu das novas letras e os dedos desconhecidos da melodia não devem sofrer de câimbras por exaustão da busca de nota.
As pernas que precisam de destino e comandos e que não possuem olhos, precisam deles pra seguirem porque antigos palcos já perderam caminhos e com eles se foram... a bilheteria, o sapateado dos corredores, os aplausos.
As mãos precisam de disposição pra tocarem novos personagens, principalmente os que aguardam dentro do hoje, a oportunidade de serem aplaudidos; onde não morre o sol e onde a plateia independe de delírios pra brilhar, onde a verdade dispensa a garantia de sucesso porque entende que o que valerá no final, não serão apenas as salas cheias, será também o monólogo bem dito que ignorou a euforia e seus gritos...
Porque é fácil confundir a insanidade das palavras bêbadas com a coerência de um texto que a vida escreve em tempo real.
Casciano Lopes
Menino pequeno em mundo grande
Tudo era grande... a fazenda e sua gente, o pasto e seu boi 'Lorinho', a casa e seu rádio de parede, a novena e seu terço, o baile e sua sala, a cozinha e seu fogão de lenha, o forno e seu pão, o terreiro e sua paineira, a estrada e seu trator, o avô e sua charrete, a comadre e seu cachimbo, o moinho e seu alpendre, a benzedeira e seu carvão... o milho, a plantação, o poleiro, o rastelo, o canivete, o fumo de rolo, a camisa curta e seu bolso esquerdo de guardar o mundo, começando por amoras e seus pés grandes, de guardar menino em sua varinha sem condão.
Casciano Lopes
25.1.24
Desenho também gasta
Quando menino, no tempo em que minha caixa de lápis de cor era pequena e de seis cores, o mundo que eu pintava cabia mais cores e com poucos traços, as cidades eram erguidas e nelas não haviam ruas que não me coubesse.
Pequenos quadrados
Quando tento encerar meu chão, buscando o brilho dos tablados... Não é pra impressionar os que eventualmente passam pra conferir o zelo; é pra que eu deslize com mais facilidade por meus cômodos apertados e consiga refletir em meus assoalhos, toda a circunferência da vida, que como o mundo, é grande, mas que precisa caber em mim, pequeno.
Noturnamente
A ousadia da noite que chega calada, faz madrugar as dores e apaga as paredes do corpo pra que eu durma. Não sei se por canseira ou coisa assim, permito o sono e ouso sonhar enquanto durmo. Então amanheço... O que também é ousado.
23.1.24
Adapte-se
A vulnerabilidade da vida nasce antes dela,
no útero, e permanece até a morte,
quando até o forte se deita e se cala pra sempre.
Casciano Lopes
Casciano Lopes
Labirinto
Vai muito além da alegria... o riso.
Vai muito além da tristeza... o choro.
Ambos nos levam pro coma...
e nos deixam lá pra achar a saída.
Casciano Lopes
Tudo na palma da mão
Uma sala, um escritório inteiro; TV, câmera fotográfica, filmadora, PC, impressora, álbuns, vitrola, calculadora, máquina de escrever, telefone, fax, cd, dvd, disquete, LP, bússola, telex, lanterna, gravador, calendário, rádio, agenda, relógio, guia de ruas, mapas, despertador, enciclopédia, caneta, papel, arquivo, livros, jornais, revistas, pastas, selos e carteiros no portão... Bancos e seus sistemas, empresas e reuniões... A lista seria imensa!
O mais perigoso e desastroso é o silenciamento sem cabimento, mas que também cabe na palma da mão... Num aparelho de poucos centímetros, encurta-se quilômetros e também deixa distante o abraço, cada vez mais distante o afago, o olhar, o cheiro, o beijo do encontro, o lenço emprestado num gesto delicado, o colo do acolhimento... A audição fica comprometida, a leitura fica tendenciosa e a escrita que toma o lugar da fala, tem pressa e vira especialista de conhecimento nenhum.
Na palma da mão, o equívoco graduado, a valorização da ignorância e a validação da intolerância.
O poder do cancelamento, do bloqueio, do grito em caixa alta, da razão unilateral colocada acima do bem comum, a surdez que adoece a língua, que esquece das palavras gentis porque não as usa e por não usá-las, morre lentamente em curtidas e compartilhamentos a missão da humanidade de conviver e de praticar afeto e respeito.
Tem tudo na palma da mão, menos o aperto de mãos.
Casciano Lopes
Na barriga da noite
Djavan inicia uma canção dizendo: "cuida do pé de milho, que demora na semente".
E eu quero dizer da demora adormecida, aquela que descansa e espera em gestação.
Algo que se quer muito, precisa ser formado antes dentro da gente. Tudo nessa vida tem o tempo da semente, e o cuidado faz brotar o nosso pé de sombra, nosso pedaço de sonho de fazer caber nossa demora.Casciano Lopes
21.1.24
Amanhãs livres
Quando ocorrem compressões dentro da gente; de toda ordem: veias e artérias, vasos e ligamentos, juntas e cartilagens, músculos e vértebras, ossos, tendões ou nervos; é quando a gente entende que é soltando que se liberta o fluxo da vida e não prendendo do lado de dentro... As mágoas, os arrependimentos, as angústias e decepções... Como disse Viviane Mosé em 'Poemas presos': "Palavra boa é palavra líquida/Pessoas adoecem de palavra presa.
Casciano Lopes
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