30.6.24

Post scriptum

Fuga daquilo que dói não é cura, é atadura que esconde a ferida sem tratamento, é o controle dado ao medo, é manter em sigilo um diagnóstico, ignorando o remédio da coragem.

Casciano Lopes

Diálogo com as agressões

Entre ferir e ser ferido,
existe o fio da espada que corta
e a mão que a empunha...
que corta não só a carne,
mas a possibilidade das ligações
entre o finito e o eterno.

Casciano Lopes

29.6.24

Tá lá um corpo... Construção

A gente se constrói aos poucos, no alicerce da infância é erguida a capacidade da lágrima, pra que nas paredes da maturidade, se consiga diferenciar o valor do riso que espera na porta aberta e o preço do choro quando ela se fecha.

Casciano Lopes

28.6.24

Aniversariante e o tempo

O tempo se uniu pra ouvir e contar tua história e também se encantou com tuas verdades, ventou leve teus casos contidos e abrandou o mar dos teus segredos, fazendo calar todo grito pra se ouvir apenas o aplauso por teu dia.
Conta o Mestre do tempo: - que os dias se multiplicarão, que serão fartos os risos e que em cada passo teu, será soprado um bom caminho.

Casciano Lopes

Selados

O que nos mantém dispostos ao riso não é o produto do sinistro, é o prêmio do seguro, da apólice que assinamos em outros tempos, longe daqui, onde o compromisso estava além das perdas, firmado no propósito parceiro de um ganho maior... O cumprimento do agradecimento, com todos os seus méritos instalados no amor.

Casciano Lopes

O pacto de luz todo dia em parto

Eu não saberia dizer o que seria sem sua presença e o que mais diria depois de ter você?
Os dias caminharam por nós e foram tantos os que amedrontaram nossas manhãs! Mas também foram muitos os que pousaram suas tardes na nossa rede e nos ensinaram a descansar.
As noites que cerraram as cortinas da nossa casa nada puderam com as janelas abertas da nossa alma, que nos ensinaram a ter olhos de acreditar na claridade.
A clara luz que nos guia sempre... exposta na nossa mesa quando precisamos repartir a vontade, quando precisamos servir em prato fundo a esperança e a força pra seguirmos juntos.
Nunca foi fácil, mas o empenho pelo sorriso do outro fez possível o inacreditável.
E é assim que sigo a lida, fazendo viver em mim o compromisso com a vida, porque você vive ao lado e me ajuda a entender o impossível.

Casciano Lopes

Alegria disposta

De todas as alegrias, guardo principalmente as que me custaram a disposição das mãos quando se estenderam pra alcançá-las, as que couberam dentro do meu abraço, quando os braços quiseram ceder o afago, de todas... guardo a memória dos lábios que riram sem cobrar motivo, apenas porque eram lábios e ficavam mais bonitos sorrindo.

Casciano Lopes

24.6.24

Recalculando a rota

A meta, quando pequeno, era não cair, não chegar com a comida fria na roça pro almoço do pai, proteger o irmão pequeno dos perigos da fazenda e não derrubar o leite que ia buscar na mangueira de manhã...
Fui crescendo e a meta era fugir das notas baixas na escola, escapar dos meninos maldosos e caprichar no asseio dos poucos pertences...
Continuei ganhando anos e a meta passou a ser o primeiro emprego, ajudar na feira, olhar os irmãos e deixar minha mãe orgulhosa...
Já jovem, queria estudar, quis viajar, as metas se ocuparam do futuro e precisaram, em nome da inteligência, brigar com padrões instituídos.
Cresci e o amor desperto me fez capaz de ser quem eu era e não o que me diziam que eu devia ser. Quis ser honesto com minhas vocações e fiel aos meus ideais, a meta era me sustentar e adquirir, como todos, o mundo...
As metas foram, aos poucos, se tornando rotas alteradas.
Quis envelhecer com dignidade. A certa altura da tal 'maturidade', a meta era apenas ser de verdade. Rompi com as normas e construí a minha cartilha. Quis manter a aventura como uma ferramenta de vida e elaborar, cada dia mais, formas de entender o avanço do tempo como meu maior patrimônio. Quis juntar nele, o tempo, uma boa história.
Tudo passa... Pessoas, dores, medos, frustrações, decepções; alegrias também passam. Passam as metas e, com elas, eu no tempo; o tempo que permite minha viagem e que parece estar debruçado na janela me vendo querer e querendo dele, o Tempo, apenas a nota de aprovação na escola das idades, nas disciplinas que exigem coerência entre quem sou e quem penso ser, de onde vim e pra onde vou, sujando o mínimo possível o chão que me levará às respostas ao final de tudo.
Quando tudo finda... Finda?
Hoje, na minha história, é interessante observar que as metas são muito parecidas com as do menino: cuidar pra não cair, continuar enxergando e andar, e assim, sendo produtivo, esticar um tantinho mais a caminhada com os pés colocados no que acredito e dispostos sempre a defender meu destino com os olhos de quem comprou a passagem ainda menino.

Casciano Lopes

Sem medida

Eu não quero ser a régua do mundo. As unidades de medidas pregam limites, e eu, vivo além dos centímetros.
Sinto muito! As quilometragens das rodovias não são capazes de me parar com placas de recomendações. O destino sim, sabe mais sobre quem sente muito e espera de mim apenas que eu entenda da vida sem métrica, e que quando eu me olhar não veja o fim.

Casciano Lopes

21.6.24

Jardim plantado e regado

Daquilo que dói
a gente esquece a rega
e do que sara,
a gente cria e fotografa
pra lembrar de molhar
quando a dor rondar.

Casciano Lopes

20.6.24

Farol de atenção

Não se demore no lamento, ele por hábito turvará seus olhos, impedindo o trânsito das belezas em sua vista, causando o atropelamento das verdades e convencendo por mentira que a vida é sofrimento.
E não é só um momento que passa, a vida é uma eternidade que fica, e que, enquanto dura, precisa trafegar livre de acostamento... um lugar de esconderijo, onde se mente o motivo dos lábios sorrirem em nome da causa dos olhos verterem e as mãos viram lenço, podendo ser só agradecimento.

Casciano Lopes

19.6.24

Em dois semestres

Amo maios, junhos, setembros, outubros e dezembros... janeiros me agoniam e nos demais meses tento me lembrar de virar as folhas do calendário e dar as costas ao passado que me faz um hoje, querendo sem ter, o amanhã.
Tudo é cheio de tempo, todo o meu templo de morar é cheio dele.
O ontem não pode mais me avaliar, já deixou em minhas paredes os seus diplomas e dele só posso ter a prática de suas teorias.
É entre teorias, teses e hipóteses, que procuro praticar a vida que comete um paradoxo - construir permanências dentro da impermanência - onde posso exercer o direito de me juntar aos dias e entre folhas escritas e brancas feito pálidas, escrever cabeçalhos e rodapés, com meu nome entre eles, fazendo a ponte entre quem fui no ano passado e quem ainda sou ou serei depois que a chuva passar. Serei?
A vida é um 'não sei' cheia de certezas.

Casciano Lopes

Agendado

No
Dia
Que
Vem
...
Vou.

Casciano Lopes



18.6.24

Nas linhas, o bem em locomoção

Mais que a negação é o toque das mãos,
mais que a oposição,
mais que a falta,
que a solidão dos anéis...
Bem mais é o toque das mãos,
vai além dos dedos e do que eles apontam,
além da vocação de fala quando gesticulam palavras,
e que, quando tocam,
calam o grito e põe em silêncio a inquietação.
Mãos.

Casciano Lopes

17.6.24

Texto por canalização xamânica

A vida não se explica apenas com o toque suave da brisa que sopra das montanhas quando se está na planície... Ela também se justifica quando se é a própria montanha açoitada por um vento forte, quando se é a areia da terra soprada pela ventania. A vida se multiplica dentro de cada um, quando por instinto, a escalada por nós se faz necessária, pra que do alto possamos nos ver melhor, e a partir da contemplação, nos enxergarmos maiores do que o pequeno gesto da tempestade que passa diante da vista de todos que nasceram pra entender a grandeza do silêncio que o mundo sabe fazer quando a chuva vem e quando a chuva vai.
Viemos pra nos vencer, pra isso, precisamos nos conhecer e conhecendo, nos apresentarmos ao mundo como carta aberta de aprendizado, onde possamos ler e sermos lidos, e lendo, aprendermos e ensinarmos.
O choro que lava os olhos de questões é o mesmo rio que corta as montanhas, que cheio de destino percorre a Terra, lavando e levando pelo caminho tudo o que precisa de novos olhares de respostas.
Nos sofás dos viventes, cabem as lágrimas dos 'nãos', mas também cabe o estio que o 'sim' provoca na face da alma, o lado da vida que não pode ser tocado por ninguém de fora, ...além do possuidor do riso aberto... ninguém pode; feito o sol que clareia o topo dos cânions sem que ninguém o impeça disso.
Então...
Nem sempre o que nos cala empobrece a vida, às vezes enriquece o tempo.

Casciano Lopes

Porque passa

Passamos a vida querendo dela o milagre da eternidade de tudo o que faz durar nossos aplausos, enquanto o seu milagre está muitas vezes na perenidade do silêncio das mãos que sabem acariciar sua passagem...

Casciano Lopes

15.6.24

Somos ainda questionários

Tenho medo de quem tem respostas pra tudo... acredito mais nos pássaros que conhecem de clima e migram antes do inverno, nas árvores que se balançam pra se livrarem das folhas no outono sem que alguém às avisem do calendário...
Quem sabe de tudo tem o hábito de saber sobre você o que, com muito esforço, só poderia ser imaginado. Não acredito.
Saber de mim... As margens que me comprimem o sabem mais, as paredes com seus portões me sabem, me sabem as madrugadas sem falas, as manhãs que amanhecem deitadas e já cansadas na minha soleira, as noites que apagam a lágrima que já nem sabe cantar a cantiga de ninar.
O sabedor das respostas do mundo, não passa de um amador e nada sabe dele e sua dor.
Tenho medo.

Casciano Lopes

14.6.24

Mimos trocados

Afetos são trocados porque o outro precisa ser afetado, modificado no toque que atravessa sua necessidade.
Tenho no meu imaginário uma carência, quase uma deficiência de cafuné na alma, daqueles gestos que parecem ninhos que põe a gente no piado do bem querer, e que quando a gente cala é porque dormiu sem querer mais piar por segurança... é porque de tanto afeto a gente pode tudo, até se mostrar pequeno pra caber no galho do colo.

Casciano Lopes

Na vida

Desenhamos as letras em rascunho o tempo todo, buscamos acertar o traço, grifar importâncias e argolar o que não podemos esquecer.
Embora a borracha exista e nos sintamos tentados a usá-la, não nos é permitido, mesmo que por vezes algumas anotações sejam tidas como provisórias, quase nunca teremos tempo de passá-las a limpo.

Casciano Lopes

Eu tenho um sonho....

Subir na montanha das palavras
de uma vida inteira,
e quando olhar para trás,
do alto enxergar mais livros
que páginas em branco.

Casciano Lopes

Vitrine em menino

Desde pequeno fui treinado; apontado, entendi sobre exposição e muito cedo, aprendi que meu telhado deveria me proteger, que desabrigados eram os que estavam fora dele, 'sem tetos', e por isso os dedos em riste e as mãos encarregadas de pedradas.
Hoje, ainda em mira dos que não possuem vidros envoltos em suas construções, sigo construindo transparências, porque sei que assim as pedras me atravessarão, enquanto eu, exposto como quem nada teme, permaneço ileso, em destaque.

Casciano Lopes

Ainda na escola

Falhei muito e em muita coisa, deixei de praticar o melhor por tantas vezes não entender seu caminho e quando pensei saber, era só a vontade travestida de sapiência.
Por canseira errei na subida e o trajeto tantas vezes foi na contramão de quem esperava minha direção. O fluxo trouxe a descida e lá embaixo, na pista por onde circula o tempo, me busquei na multidão dos ponteiros, tentando encontrar meus segundos apressados, meus minutos equivocados, afim de ajustar minhas horas pra que elas entendessem que o amor dita as regras e sempre ditou; eu que preciso me alfabetizar todo dia, pra escrever na pele suas palavras, pra que haja mais acertos na leitura que erros na interpretação do destino das minhas mãos.

Casciano Lopes

13.6.24

Quando nos sentamos à sombra

Nunca faltou a proteção da forma mais plena de amor, a que cuida sem imposição ou condição, a que zela e se importa antes da interrogação.
Em tempo algum faltou o olhar pra tudo que passa, pra perenidade da flor ou pra fragilidade da lágrima, assim como pra fartura do sorriso, quando em promiscuidade com a boca, fez a casa abrir suas portas pra entrada de tudo que provocava cócegas.
Por fim, ainda não falta na cidade que construímos no outro e onde moramos, no sol ou sombra de nossa idade, a capacidade de descansar, sabendo que nunca faltou ou faltará o encontro diário de nosso compromisso... O outro.

Casciano Lopes
Para o eterno namorado que guardo na sombra da minha gratidão.

11.6.24

Não são só palavras

Palavras são interruptores que acendem a sala ou apagam o quarto... clareiam os cômodos com um toque de língua ou põe pra dormir no silêncio da boca adormecida, o ouvido da casa.

Casciano Lopes

10.6.24

Em obra

Tantos lugares que me cuidam
Tantas histórias que me constroem

...

Memórias de ouvir na vitrola dos ouvidos
Pedaços de mim nos álbuns de fotografias de meus olhos
Pessoas que dizem versos na minha boca e que restauram minhas ruínas com penas

...

Que se penso em parar a construção
Dispenso o pensamento pra não me negar abrigo e fujo depressa pra junto de onde me distraio com a reforma de tudo que não sei, mas que preciso aprender dizer.


Casciano Lopes

Depois das cinco

Quase amanheceu

Quando a noite quis ir embora

E a noite quis amanhecer

Ir embora

Amanheceu.


Casciano Lopes

Há jeito de florir

Os pedregulhos do caminho nada podem contra os pés que sabem riscar canteiros. Ainda haverá chão sob os escombros enquanto houverem acordos entre a flor e o caminhar das sementes.

Casciano Lopes

8.6.24

Vida em locomotiva

Na viagem encontramos o aço da bagagem, mas também o abismo das flores em mala de mão, onde aportamos do trem de ferro pra abastecer de delicadeza nossos vales e entender que não se viaja na dureza da pressa, mas na gentileza da pausa, assim como o partir que precisa da chegada pra seguir e o viver que carece do nascer pra morrer, todo dia.

Casciano Lopes

Um sonho por favor

Vez ou outra me pergunto sobre a realidade, saio do sonho sem pedir licença e cometo o despautério da questão. Com as mãos espalmadas sobre o rosto, cometo a dureza da pergunta e nem sempre espero a resposta; volto pra casa, onde sonhar ainda me ancora na verdade, porque o que me dizem ser real, é só a mentira brincando de pesadelo.

Casciano Lopes

7.6.24

Sinal de ocupado

Ocupe os espaços do mundo,
a rua toda,
a vila,
a cidade toda,
ocupe.

Ocupe a casa que mora,
o parque do bairro,
a praça da esquina,
o banco,
ocupe.

Ocupe a vontade de ser,
a coragem inteira,
o abraço todo,
o olhar,
ocupe.

Ocupe o corpo que respira,
a Terra que inspira cuidados,
o outro que pede tempo,
o tempo,
ocupe.

Casciano Lopes

Tu não sabes

Até que o relógio do sol te chame
e o corpo te clame, não sabes do dia,
nem da noite que em ti dormia.

Casciano Lopes

Apetite

A fome pede degustação, assim como a vida pede gosto, e é preciso gostar do tempo e saber: ele lambe os pratos onde somos servidos ao sabor que sacia a vontade de ter tempo pra lamber a vida.

Casciano Lopes

2.6.24

Iluminação

Nas madrugadas da vida ou no breu das horas,
é preciso estar atento ao que nos ilumina...
Assim, jamais ficaremos no escuro da interrogação.

Casciano Lopes

1.6.24

Uma Tereza, mãe de fé

Não fosse o Divino em mim, talvez não fosse mãe... Ser mãe exige divindade.
Talvez meu altar estivesse ainda sem flores, não fosse o divino em mim.
Não fosse a fé sentada em meus degraus, talvez eu não subisse tão alto quando o medo balançou a escada.
Talvez os campos de girassóis estivessem cabisbaixos e o próprio sol deixasse órfão meu sentimento de fé....
Porque precisa estar aquecido o amor, e sem ele, morre a fé, e com ela a mãe dos filhos antes da carne e a filha de Deus antes do espírito.

Casciano Lopes
Em gratidão à grata amiga Tereza