29.7.14

Queda livre das águas

A chuva que lava os olhos
É a mesma que lava a terra
Mundos molhados de rios em busca do mar.

Casciano Lopes

Em off

Meu silêncio...
Canta, murmura
Chora, soluça
Ou... simplesmente silencia.
Nos seus agudos
Aprendo ralentar calado.

Casciano Lopes

Do que é cíclico

Era o tempo que cozia as cãs
E o tinto tão da moda era cru.

Ao ponto apaga-se o fogo
E acolhe o Universo quem dele brotou.

Casciano Lopes

Até que se expire


Fio durável

Na costura da linha o pano esgarça...
O tempo não.

Casciano Lopes

Isca calada

Que a pesca não assuste os peixes e que os gritos não desviem o curso dos rios.

Casciano Lopes

Teimosia moralista

Nos vestem camisas pesadas
Nos colocam abotoaduras nas mangas
E teimam em apertar os colarinhos
Quando tudo que queremos é andar nus
De frouxos cintos até que se dispam as pernas
Dentro do caminho das levezas.

Casciano Lopes

Visto um livre por aí...

Das vergonhas pouco tenho o que dizer
Não possuo capacidade de entendê-las
De modo que penso ser um desavergonhado.

Casciano Lopes

Angustura de tristura

A mesma correnteza que desce cantarolando o desfiladeiro
Chora soluçando as barrancas do triste, da tristeza hospedeiro.

Casciano Lopes

CEP de minha rua

Preciso saber mais do que mora aqui
Do que daquele que ainda está no caminho
Num caminhão de mudanças.

Casciano Lopes

Se pular as janelas, sou 'Do Pulo'

Se a alegria está dentro de casa
Perco as chaves
Se está do lado de fora, viro chaveiro.

Casciano Lopes

Correspondência balbuciante

Se meramente eu disser um sorriso
No silêncio com esmero correspondas.

Casciano Lopes

Certidões

Ao longo da vida nascemos e nascemos, sem 're', só nascimentos.
Ainda tenho 43 anos e aguardo tantos outros nascimentos futuros, tão importantes quanto todas as datas em que, de novo, nasci.
A capacidade de recomeços não vem ao acaso, vem das impossibilidades e nelas temos o dever do descobrimento das coisas possíveis e então, dá-se o nome: possível. Sim, é possível nascer quantas vezes se fizer necessário.
Assim vou colecionando certidões lavradas nos cartórios das vilas por onde andei.
Aprendi ainda que antes de cada 'dar a luz', houve um período gestacional, períodos de noite sem lua, de deserto escaldante onde o encontro era comigo mesmo. Em cada um desses encontros pude conhecer um lado ainda não explorado e neles, conquistas importantes aconteceram, sempre de dentro para fora.
Assim, maio de 1996 quando olhei pela primeira vez meu grande amor, não foi menos importante que outubro de 1970 quando olhei o mundo pela primeira vez e, por conseguinte, setembro de 2012 quando descobri o reiki e nele fui iniciado foi tão importante quanto as duas datas anteriores... E agora em julho de 2014 com a montagem do consultório Kurama de terapias reiki e florais me descubro um novo nascido.
Que bom que essa vida seja assim dividida e que em todo esse tempo houve mãos de 'parteiras' que auxiliassem os partos. Gratidão sempre aos emissários que o tempo trouxe para manter os ponteiros circulando. A mim coube pulsar e posso dizer... Vivo!
No último período que fechou um ciclo, eliminei literalmente um peso que carregava há duas décadas, 22 quilos e agora com o espelho está tudo lúcido; uma das tais conquistas mencionadas em períodos sem lua. Em outro anterior a esse a poesia me encontrou e nela conheci essa que até hoje é minha força motriz.
Enfim, hoje mais feliz quando se descortina o novo mundo, porque a cada nascimento se desvendam novos prismas, continuarei contando com todos que fizeram parte dessa ainda tão pequena história, mas que com certeza é bem grande na vontade de continuar chancelando passagens nesse trem chamado vida.

Casciano Lopes

13.6.14

Minha cara nada cara

A hipocrisia chama de ilustre a um desconhecido.

Casciano Lopes

Além das horas

Todos os dias faço cama e mesa como se fosse receber visitas
O novo que amanhece é um desconhecido que carece de atenção.

Casciano Lopes

30.5.14

Comunitário dolor

A alegria vive do lado de dentro, sobretudo quando o individuo não vive do lado de fora da lágrima alheia.

Casciano Lopes

Espaços invertebrados

Quando nada é que sou meio
Quando tudo é um nada inteiro
Tudo não é, nada há.

Casciano Lopes

13.5.14

Poder vulcano


Auto conhecimento

Não lamento o fato de não agradar a todos, não perco um minuto de meu precioso tempo me ocupando com desocupados e não desvio um milímetro de minha rota para buscar caminhos que não são meus.
Houve um tempo distante em que a opinião alheia me afetava, mas os dias passaram e trouxeram amadurecimento, hoje não me prendo ao que não tenha nascido de meu coração.
Sou afortunado, tenho ao meu lado o homem mais especial do mundo, a família em que nasci foi escolhida entre as melhores sementes e os poucos amigos que fiz... poucos porque soube escolher, são para a vida toda e tenho certeza que ás 4 horas de uma madrugada de inverno, atenderiam o telefone e me ajudariam caso eu precisasse, então... o que posso querer mais da vida? Só tenho a agradecer e a estes dizer, que a recíproca é verdadeira até em madrugadas chuvosas.
Tenho capacidade de produção. Escolhi vertentes que nem todos compreendem, talvez porque não viva dentro da caixinha do sistema, mas é fora dela que hei de viver até o último instante. Não me obrigo a ler o que todos leem, pendurar os diplomas que todos penduram, apertar as mãos do egoísmo, fingir ser político ou polido.
Sou uma produção independente, o que faço e falo condizem com um pensamento baseado no que acredito, os que arrebatei foi porque me emprestaram verdade e a esses, dou-lhes a minha.
Casciano Lopes

Disse a cadente

Eu estrelinha
Entrelinha deduzo
Constelação me escreve
Seu brilho traduzo
Pequena como ribeirinha
Me escorro por entre luzes.

Casciano Lopes

22.4.14

Já fui


Tenho em mim

Relâmpagos e trovoadas
Raios e nuvens pesadas
Ora chovo tempestade
Ora chuva mansa
Ora só garoa
...Nuvens claras
Ainda convivem sol e lua
Chão e estrelas
Uma noite toda noturna
E outra clara como o dia
No findo ter, da luz que não se acaba.

Casciano Lopes

Os mundos são rotas de fuga

Na quebra do vento
Me descubro curva
Na dobra da água
Me encontro esquina
Na descida da terra
Me vejo subideira
No ardume do fogo
A própria madeira.

Casciano Lopes

Desconcerto do equívoco

Para que serve a arrogância humana, cultivada pela ignorância, adubada pela hipocrisia e aguada pela demagogia?
Se todas as quatro serão sepultadas juntamente com o corpo vil, um corpo que não viu a solidariedade e desconheceu qualquer forma de amor?
Num além, pós-pó... restará um aquém do que não se pode remediar.

Casciano Lopes

Conceito

Você questiona a verdade das relações humanas
quando suas necessidades especiais
transformam-se nas dificuldades do outro.
Casciano Lopes

Um substantivo masculino

Amor é talvez despretensão
Germina do que não se precisa razão
É quem sabe casa no vento
Abriga até a velocidade do tempo
O amor tal qual a cegueira precisa crer
E nos tropeções ainda amar o decrescer
O amor precisa urgentemente amar
Quer ser visceral, imparcial se apresentar
Amor, forma singular de existir
Sem ele, o crime e o castigo é se reduzir.

Casciano Lopes

11.4.14

Raiz forte

Eu continuo por aqui
O tempo cozeu as raízes
Algumas ficaram doces, eram amargas
Doces outras, fortes tornaram-se

Moro na mesma casa de madeira
Com paineira no terreiro
e 'João de Barro' vizinho do poleiro

Vivo no mesmo banco do pé de amora
Cá dentro corre uma estrada de terra
E na boca ainda da fruta o gosto aflora.

Meu endereço não envelheceu
O carteiro me encontra, o leiteiro
Os que voam minhas lembranças
Traçam os mapas para o que se perdeu.

Casciano Lopes

Pano de fundo


3.4.14

O poema cabe num ponto final

O poema fala de um instante
É um momento de poesia
A hora é dela quando acontece
...Da poesia
Ora uma alegria faz dispará-la
Ora a tristeza o faz
Ora desce sem motivos...
E o poeta neste instante
Não tem começo e nem fim
Há que ser respeitado o poema
Diz a poesia quando ponteia o poeta
Em um ponto final.

Casciano Lopes

26.3.14

Assédio... um capital falido

Quiseram calar-me
Afugentar minhas capacidades
Quiseram bulir no que há de mais primitivo
Tolher minha liberdade de expressão
Quiseram o tempo todo...
Descontentar-me para submeter-me
Divergir para proibir meu pensamento
Desvirginar minha condição humana
Expondo minhas vergonhas
Envergonhando o caçado quinhão
Quiseram sim...
Omitir, mentir o merecimento
Desmentir, oprimindo o lutador

E pela palavra que aprendi
Bradei, bastei, rasguei acordos que não fiz
Hoje sou a caça e o caçador
Capaz de reprovar quem quiser se adonar
Sou a cartilha e quem a escreve

Um trabalhador.

Casciano Lopes

Nas vias de meu silêncio, meu barulho

Quando as paredes silenciam
Ainda resta a rua...
Esta jamais nega uma árvore falante
Uma mulher que resmunga e um menino brincante
Há vida que corre nas calçadas junto aos pássaros
Enquanto bancos escutam sonhos que voam.

Casciano Lopes

Linhas além

Todo dia construo janelas nas velhas paredes
Paredes gastas, sem mais linhas para tanta história
O mundo que vejo através de minhas vidraças
Possui linhas virgens, sobras de tempo esperando casos.

Casciano Lopes

Cabe quanto pesa

Se soubesse o quanto
Talvez em mim
A medida não caberia
O quanto, se perderia
E eu, continuasse sem saber.

Casciano Lopes

Nada vejo... Nada ouço... Nada falo

Fugir, pode ser nada fazer
Imobilizar-se, também é fuga.

Casciano Lopes

13.3.14

Quarto e cozinha

Até o aperto...
Dos corpos espremidos em vãos
Dos corredores estreitos de chão
Dos exprimidos anseios castigados
Dos inconsoláveis enfeites pendurados
...Não se sabe
Até...
Que as plantas reclamem da falta de sol
Que as portas se fechem em caracol
Que a rua desminta um endereço
Que a casa pressinta fim ou começo
...Não se sabe
Da liberdade, dizer
Da amizade, o que é
Da dor, o doer
Da tarde, um fim de fé
...Até
Conviver com seus cômodos
Vizinhos ou parentes incômodos
Rever ausências e suas reticências
Desalinhos virar caminhos de residência
Não se sabe...
Da força do quarto e cozinha de cada um.

Casciano Lopes 

11.3.14

Pessoa de minha pessoa

Vou passar feito a feia da esquina
Ou a bonita da vitrine
Tornar-me obsoleta como notícia
Ou a capa mais vendida da banca
Esta pessoa passará, o manequim
...Até mesmo o jornaleiro
Passar, um verbo em plena execução
Comum às pessoas
Que não querem conjugá-lo.

Casciano Lopes

Via

Quando sou calçada
Duro mais que pedra
Não quero só o concreto
Quero o sentir, rua úmida a fluir
Sei que posso ser a chuva
Traçar com pernas calçadas
Se não um Gene Kelly, talvez sua passada
Sua dança, seu calçado encharcado
Mais que calçada, um chão
Um jornal molhado, um habitante
Uma folha itinerante, um guarda chuva, quem sabe...
Abrigar o abstrato enquanto me disfarço de passagem.

Casciano Lopes

7.3.14

Sentir x Falar

Há momentos em que a língua se cala
O coração se abala e a palavra perde a fala
Há um instante no tempo
Em que os verbos se prostituem
A cartilha se omite e o lápis perde a calma
Há um homem em tudo isso
Há muito... Há pouco... Agora mesmo
Há e haverá o que pensar, se não dizer.

Casciano Lopes

Do inferno

Me adjetivam todo o tempo...

Envergonhando vez ou outra, o dicionário dos bons modos das palavras
Atiçam minha ira enquanto discordo do mundo
Enfurecem meu quietar e eu só penso em quieto ficar
Me arrancam as medidas e ainda assim, teimo em me despir, vestir ideias

Descubro em cada ciclo lunar, um [da lua] em meu interior
O mesmo louco que aflige os obscuros difamadores sem astros...
Continuarei enluarado, da lua, de lua, em lua...
Porque sei que não sou daqui, é que me calo
Deixo a guerra para os que pleiteiam um pedacinho desse chão falido

...O inferno de cada um.

Casciano Lopes

...Da possibilidade morar

Se não puder construir...
Eu acampo.
Casciano Lopes

26.2.14

Ribonucleico

Quando os ossos desconfiguram-se
Desmontam-se e de esqueleto perde a forma
E já não mais sustentam carne, nervos e veias
Se guardando em caixa, mesmo que em cinzas
Ainda distingue-se o DNA
Por alguma razão a eternidade afirma-se
Assim como o sentir que o fogo não lambe.

Casciano Lopes

Como se possível fosse

Vou ali...
Disfarçar com goles de canções antigas
Uma dor que a falta constrói
E já volto... quando tiver aprendido
Desconstruir ausências edificando a mim mesmo.

Casciano Lopes

Na minha gaveta

Mora uma estrela, grandezas
Vive um mar, pérolas
Brotam açudes e rios
...E guardo dobradas
A calma da floresta
E a cantiga da chuva
Tudo em meu silêncio sem grito
Ou nos uivos de meus ventos contidos...
Engavetados.

Casciano Lopes

Proferir

A espingarda com seus tiros, acerta o alvo visto
A palavra com seu fio de corte, sangra o que não se avista...
Um indefeso
O menino que todo homem possui.

Casciano Lopes

19.2.14

O menino que conheceu terreiro

Lá em casa chamava-se terreiro
Nele, era a paineira que fazia a sombra
E de barro era o forno plantado nele

Pão caseiro, folha de bananeira
Pé de urucum, goiaba e amora
Torrador de café, pilão
Moinho, rastelo e vassoura de palha

Burquinha correndo na terra, pião
Cavalo de pau, sabugo de milho
Bola de meia, pega-pega
Esconde-esconde e passa-anel

Lata fervendo, batedor de roupas
Comadres de prosa no poço, cachimbo babando
Quiboa que alveja, a grama que quara
Cerca farpando os remendos que secam

Cigarra esganiçada, bambuzal que não quebra
Feixe de lenha, poleiro, galo cantador
Porco na lama, ovo no ninho
Moleque esperto e frango gordinho, disputando a vida

Fogueira, sanfona e cantoria
Sapo que desafina, cigarro de palha
Lamparina, toco de vela
Grilos combinados e pirilampos desocupados

Borrachudos atrevidos, tapas e pegada de mão
Donzela de vestido de missa, rapazote de chapéu panamá
O pai que vigia, a mãe que cochicha o caso que conta
Dedo de pinga e lua no pasto... num cheiro de dama da noite

Tudo coisa de terreiro
Meus quintais o tempo inteiro.

Casciano Lopes

11.2.14

Compactante

Um instante, é tudo que temos
Nele, cabe horas e todo o tempo
Cabe naufrágios e sobreviventes
Ele, instante que é, dita o sentido
Nele, cabe a estrada que sabe caminhos
E quem por um instante se empresta
Cabe todo.

Casciano Lopes

6.2.14

Humanoide

Todavia para ser humano
Deverás lutar todos os dias
Contra a própria humanidade
Para fazer valer tua condição humana
Porque esta, é desconhecida de teu grupo.

Casciano Lopes

Aos que Divinos são

Meus Divinos são de carne e osso como se não os fossem
Sofrem, sem banhar em lágrimas a estrada alheia
Plantam mudas, que em silêncio transformam-se em grandes árvores
Onde se abriga o pedinte e o que não balbucia nem mais uma palavra

E quando, Divinos que são, sorriem ou abraçam, cabem em seus motivos
Uma multidão de carências e outro tanto de gratidão
Aos que Divinos são.

Casciano Lopes

5.2.14

Espaço, velocidade e seu homem

O tamanho da ladeira é proporcional ao da canseira do homem
E a velocidade com que ele caminha está intimamente ligada
Com a vontade do que busca ou com a recusa do que foge.

Casciano Lopes

Eu queria saber voar

Não sei...
Sempre achei que além
Das impuras correntes de ar
Vivesse outra parte de mim
Enquanto aqui só mora
O que me faz aquém
Eu sei...
Hoje que busco o que sabe planar
Eu sei.

Casciano Lopes

O pior trânsito

Não são carros enfileirados na horizontal
São mágoas engarrafadas na vertical
E o motorista podendo ser alado, viver calado.

Casciano Lopes

Fim do findo

Finda o homem
Se finda a liberdade
E o fim do mar
Faz finda a estrada
De quem não sabe nadar.

Casciano Lopes

16.1.14

Praiano

Sei que posso pisar a areia
Atirar-me nas ondas
E adonar-me dos ventos
Quando tocam minha pele quente

Mas ainda prefiro pedir licença
Entender-me pequeno
Para poder continuar contemplando.

Casciano Lopes