8.12.11

Ideias insanas

Um perdido

Inigualável insano
Queima cartuchos antes da luta
Na luta se rende
Suspendendo mãos em bandeira branca
Sem armas se esconde dentre risos
Caricato disfarça um ferimento...
Que palpita...

Sobre e sob pés

Dança como bailarino

Um sapateado

Esmagando a dor

E ela... A dor?
Foge!


Desabrocha ao lado,
Feito gêmea
A companhia


Doente pelas ideias que compra

Soma
Adquiri
Assimila
Acredita
Que exista
Sua criação
Em pirâmides
É seu amo de leite...
Que 'sustança'!
Crescem...
Grandes demais!
Não
Pode
Carregá-las...

Para onde levá-las para fazer viver?

Ideias reais
Do irreal e imutável louco em torno
O mundo comum
E o camarada que criou o incomum?
Incomum é não ser louco
É não querer viver para ser...

Louco
Louco!

E quer, quer muito!
Insano é ser imutável
Melhor é ser mutante
Incomum sonhador de loucuras
Foge, foge, foge...
Se esconde
Nas ideias aumentadas.

Hoje disfarça-se
De um...
Só mais um...
Louco qualquer.


Casciano Lopes

Nos Cascos

Caminha por baixo, lenta, lesa e certa da chegada, dada à balançar a cabeça, dá com a língua, mal educada!
Quase em sonolência, à mostra carapaça, passa muda, em regime de folhas e palavras, cascuda, faz assento ao despercebido, andando um centímetro por minuto, não está estressada a que dança, sei lá que ritmo.
Esperta, guarda o que é carne e assim fica indigesta. O que por ela manda o recado, chega envelhecido. Da morte bem que poderia ser anjo de busca, poderia ser tudo... Preferiu ser tartaruga, sem cardiopatias...

Casciano Lopes

7.12.11

Brasil demo'crático

Não foi pra mim que fizeram,
Não foi pra mim que fizeram...
Casa de morar
Rua de brincar
Escola de estudar
Hospital pra me tratar
Parque pra passear
Não foi pra mim...
AI!
Foi pra mim...
Foi pra mim...
Ai, foi pra mim

O desterro de meu mundo
Esgoto a céu aberto imundo
À margem meu submundo
Meu apelido de vagabundo
Sou povo...
Não me deram muito,
Mas pouco,
Um título de Eleitor,
Doado pela democracia,
Com uma única condição:
A obrigatoriedade do voto,
Democrático...
VOTO.

Casciano Lopes

Refugiado

Juntei meu pano de escrita
Fiz tenda do que escrevia
Colhi minha fruta no pé
Plantei  a semente um dia
Judiei no riso uma criança
Na gargalhada veio a poesia
Completei o jogo de peças
Com o fim da melancolia
Embora se foi a tolice
Restou-me a rebeldia
Enquanto ventava no mundo
Chovia na tenda, dentro escorria
As letras brotaram da semente
A fruta de minha ideologia.


Casciano Lopes

Inerente

Quem é a letra que codifica o homem?
Quem é a cela que fecha um destino manchado pela tinta azul?
Quem é a verdade de um juramento sobre a capa preta do livro?
Quem é o tormento dentre linhas criadas natas, ou seria inatas?
Quem é esculpido nos dedos? Cuspido... Escarrado...
Se não for a digital de um corpo nu,
Será a cruz fadada das linhas peladas.


Casciano Lopes

Infância de vidro

Olha que lindo!
Aquele sambudo com outros sambudos,
Agachados dando petelecos em suas bolinhas,
À mirar a terra roxa e fofa de um Paraná.
Um verdadeiro futebol de "burquinhas",
Coloridas e transparentes como a inocência deles,
Veja se não são versos de uma pátria limpa.


Casciano Lopes

Terreiro em preto & branco

Avança a noite, adentro do breu de lamparina. Distante, os atabaques anunciam que a saia da negra começa seu giro, que Birimba inda jovem toca berimbau.
As matas são cortadas por meninos de branco, os tocos se ascendem em chama no quintal, as bananeiras balançam-se no surdo do vento, o ronco dos pés, no batido do chão dão o tom.
A roda formada reverencia a raça, a cantoria de garganta afinada no chicote, ilumina a pele. O coro formado, acompanha o batido do couro, bate na noite e na mão conta o tempo, canta história. Gritam negros na madrugada, hora de fazer liberdade. No desce e sobe dessas horas em que ancestrais sonharam, não dorme o choro que vive em alegria, vive na roda, na folia, na música, no seio das matas e cidades, vive na alta e na baixa, na graça e riso de qualquer instrumento, liberdade dos fortes, estampada no branco da roupa e no tinto da pele, vivem negando ou afirmando seus ais, buscando o que buscaram seus pais.

Casciano Lopes

Abençoai as pedras que cantam

Sem cordas ao toque sutil
ao resvalar no cantil
ao se esmerar no esmeril
ao correr pelo rio
no bolso infantil
Ou nas mãos da moça gentil.

Casciano Lopes

Não é preciso morrer

Nasce...
Da madre... Filho
Da noviça... Freira
Da água... Sede
Como nasce...
Sal das salinas
Pepitas de garimpos
Ossos de jazigos
Como nasce...
Vidro do fogo
Poeira da pele
Trigo do campo.
Lembrando...
Nasce
Cresce
E morre...
Alguns morrem!


Casciano Lopes

No mesmo mar

A boia e o náufrago,
A garrafa e a mensagem,
A brisa e a tempestade,
A água e o sal.
Navegam juntos, o diferente,
Misturam-se como se iguais fossem,
A soma de diferenças.
O poeta é solitário,
A soma é que faz poesia,
Junta a alma franca,
O papel solitário,
E dança a caligrafia nas mãos
De uma caneta azul,
Quase cor do mar,
Quase fala a evolução da pena,
Quase chora diante do que transcreve...
Se não fossem as diferenças,
Clamaria de dar pena
O oceano que tenho nas mãos.


Casciano Lopes

Ainda ontem

Meus moços, estão nas ruelas que cortam meu estado de nostalgia, nas veias que latem feito cão nas cadeias de meus delitos, detentos por sobriedade, estão na provocação de cada porta e cada avistada ao longe, acima da costura fiel e abaixo do cós da sedução.
Nos meus sonhos encontro cada qual com seu corpo em viés, balaustres que sustentam meu ímpeto, aprisionando a ira de meus nervos, eles desviam-se do invisível, do que destila veneno que não mata, do que sacia a ilusão de olhar só mais um pouco.
Meus moços, seu moço...
Caminham na pele, por entre dentes de uma confusa lembrança, sem rostos, mas em corpos talhados, banhados por cheiro de mato.
Dormem em camas plácidas, ou nem tanto, distantes do suor amadeirado de meu tom de cana, fujões dos portões lanceados, das correias frouxas de franciscanas gastas. Estão nas matas virgens ou desmatadas, de um passado insano ou entrincheirado nas batalhas fúteis de um presente incômodo.
Meus moços.. Meus moços...
Ou me mata a procura, ou me mato buscando.

Casciano Lopes

6.12.11

Terra não prometida

Sou daqueles que passo sem graça
Fingindo existir pra amanhecer
Às vezes deitado e acordado na praça
Mentindo a mim mesmo pra sobreviver
Alguém que só sabe falar se for de desgraça
Sentindo de longe pra dor esquecer
Um sujo e seboso sem banho que faça
A alegria voltar pra eu não falecer
Velho tento lembrar da receita da massa
Que me fez tão bonito e me deixou crescer
Pra hoje partir e servir com cachaça
Um filho de Deus sem querer ofender.


Casciano Lopes

Moral da história

Ao meu Tanto!

No entanto...
Eu não sabia que tinha nome de
santo,
Que vinha deformando meu
pranto,
Com jeito e graça modelando um
canto.
Fazendo com as mãos uma proteção de
manto,
Me vestindo de paz em formato de
banto,
Virando o confuso em calmo
acalanto,
Tirando da vida todo o
quebranto.


Mas agora que sei...
Vou ficar no portão esperando outro
tanto,
O dia que passa em céu
amaranto,
A noite que chega trazendo o
encanto,
E a cama que espera encenando
recanto.


Casciano Lopes

Sem beleza

O mundo sem poesia é apenas um qualquer,
Beira o caos de um salve-se quem puder.


É um Paulinho da Viola sem Dança da solidão,
Chico sem Construção,
Cauby sem Conceição,
Gil sem Procissão,
Elis sem Fascinação,
Um João Gilberto sem violão.


A poesia alimenta fanfarra, banda e orquestra,
Maestrina quando sem lisonja se manifesta.


Sem ela...
Morre o palco, a luz e o cenário,
A platéia junto com seu relicário.
Órfão fica o livro, sem glossário.
O homem vira caixa de ossário.


Casciano Lopes

4.12.11

(a+b)² = a²+2ab+b²

A matemática é uma ciência exata
Porque não pede licença para ferir alguém
Não rouba o que não lhe pertence
Não faz uso da hipocrisia
Não conhece moralidades ou imoralidades
Simplesmente é o que é
Não se condena e nem se contradiz
E, há tempos, discorda da religião.


Casciano Lopes

30.11.11

Universo de um corpo

Um homem...
Outro homem...
Vários homens...
Antigo
Moderno
Arcaico
Contemporâneo
Gótico
Barroco
Andarilho
Caminhante
Náufrago
Navegante
Perdido
Centrado
Ensimesmado
Entusiasmado...
Mundo de homens...
Homens viventes
Conviventes
Um só sopro
Só um corpo
De habitar
Homens.

Casciano Lopes

29.11.11

Sepulcro de infância

Preso o brinquedo empobrece
Sem criança ele entristece
Procura lágrima quando amanhece
Querendo colo que nunca se esquece.


Numa caixa da casa guardado
O brincante esquece rasgado
Junto com o menino amadurado
Convive um boneco largado.


Passado aquele contentamento
O motivo de presente e alento
Por descuido ou crescimento
Foi deixado sem música e movimento.


As cores um dia se desbotaram
Junto com lápis os porquês levaram
Pelo caminho a inocência deixaram
Julgadas porque a beleza afanaram.


Adulto crescido, despido ou vestido
Fica...
Sem criança o homem amortecido
Quando na caixa dorme esquecido
O brinquedo falecido.


Casciano Lopes

28.11.11

Amiga do pavio

A lamparina embebida mirava a mesa perneta
A cadeira sem tinta de madeira alva bem feita
A janela sem batente estendida numa parede sem cor
E a cozinha com seu chão de vermelhão queimado
De seu posto enxergava o banheiro de criar pererecas
O pote de barro de água de poço com sua caneca de alumínio
De um amassado que mais parecia ter servido o exército
Um fogão à lenha rubro abastecido de madeira rasteira
Defumando o telhado enquanto ela, pequena colaborava.
Olhava atenta o brilho da bateria com suas vasilhas de guerra
Admirava o guarda-comidas franco e sem vergonha alguma
De desfilar sem portas suas merendas ralas e seus guardados
De domingos enriquecidos com os frangos garimpados do terreiro
Enquanto trabalhava como lançador de chamas a observadora
Não descuidava do vasilhame de guardar seu combustível
Protegido cuidadosamente em altura sobre o móvel
Toda temerosa de que se esquecessem de alimentá-la
Esperava ansiosa a próxima dose colocada delicadamente
Compartilhada, é claro, com o pavio de algodão trançado
Parceiro na arte de dar a luz feita de labaredas
Fazendo dela parceira do fogão na arte de construir picumãs.

Casciano Lopes

24.11.11

Humanamente

Ninguém é perfeito...
Uma mentira...
Quem nunca contou?
Um tapa...
Quem já não doou?
Uma indelicadeza...
Quem já não provou?
É preciso humildade...
De reconhecer, há necessidade.
Ai mora o quase perfeito
O segredo de corrigir um mal feito
É um olhar de atenção
Um pedido de desculpas então
E ser modesto num aperto de mão.


Casciano Lopes

Sala de Sinhazinha

Na parede um rádio grande em prateleira encerada
Posava em lugar de santo com sua cor aveludada
Em destaque na sala de assoalho forrada
Rezava na parede de madeira caiada
Ave Maria, dezoito horas, todo dia era sagrada
Aos domingos a moda era de viola afinada
Lembrando rancheiras noturnas dos trovadores
De sábados apadrinhados por causos de contadores.

Na mesma sala dependurado algo de invocação
Um belo quadro azul com seu vidro de proteção
Trazia uma imagem tão linda com uma bandeja na mão
Seu manto com pregas reais tinha movimentação
Só não saia dali porque o vidro impedia ou o quadro a prendia
Na bandeja dois olhos, não é que era Santa Luzia!

Nas madrugadas antes da roça
Passava ali tanta prosa
Vinha Zé Bettio
Guerino
Oswaldo Bettio
Arlindo Bettio
O rádio é que iludia
A santa que tudo via
Enquanto raiava o dia.

Casciano Lopes

Um pedido

Meu menino...
Cuide para que toda a gente
Veja o luar do sertão
Depois que o sol se deita no horizonte,
Que sintam o cheiro da terra molhada
Depois daquela chuva vinda do pasto,
Que vejam a palhoça em flor,
Os pés de amoras carregados
E a estrada de poeira cavalgada.
Cuide para que a vida
Tenha quantos dias possa contar
E que neles
O circo nunca se acabe,
Nem as paineiras e nem o algodão doce.
Que viva um poeta na garganta
E que o curió na janela
Te lembre do inhambu da minha terra.


Casciano Lopes

Na peneira

Carreadores...
Assim chamavam aquelas retas imensas
Todas paralelas que a certo ponto
Se acidentavam em curvas acentuadas.
Ainda me lembro daquele mundo de chapéus
Todos de palha como de palha eram os cigarrinhos
Colocados delicadamente atrás das orelhas.
Homens de remendos e mulheres de calças
Sobrevestida de vestidos e todos de mangas longas
Fiscalizados pelo do bigode e seu cavalo.
A beira dos caminhos via-se aos montes
Picuas que guardavam garrafas d'água ou garapa
Embornais de algodão crú com suas marmitas
Cozidas, esquentadas ou requentadas
As quatro da madrugada em fogões à lenha.
Por todo o dia os rastelos alvoroçados produziam
Limpavam as sementes folheadas que caíam.


- Sabiam que a semente cai
Para dar trabalho ao que rastela de sol a sol?
- Que as folhas se precipitam
Pois a mulher precisa cantar
Eu tava na peneira, eu tava peneirando
Enquanto abana o fruto e sua folha?


É assim...
Um chacoalha o pé aqui
Outro rastela ali
Uma abana sua cantiga acolá
Enquanto adiante uma comadre
Com seu torrador no terreiro
Em brasas torra seu café
Para na lata florida guardar
E depois moer no moinho de varanda.


Fim de tarde na fazenda
Saco de coador, bule esmaltado
Os compadres em dedos de prosa
Seguram suas canecas de ágata
Seus meninos pelo chão
Jogam felipes de prendas
E na cidade homens compõem...
Uma mesa e um violão
Asas de xícaras com pires
Cafézinho fumaçando
Uma história se passando
Traz o som do cafezal.


Casciano Lopes

21.11.11

Busca incompleta

Sou um que nasceu
Que nasce todos os dias
Tentando ser Eu
Busco e não encontro
O que encontrei
Não me completou.


Casciano Lopes

19.11.11

Homem composto

Aquele pássaro que pousa acolá
O burrico que marcha na feira
Sou eu...
A tempestade que desisti de chover
A nuvem envergonhada do morro
Sou eu...
A luneta que mira o céu
Aquele livro guardado longe
Sou eu...
Um homem colorido
O tapete estampado de voar
Tenho todos os brancos
Todos os pretos
E uma porção de céus
Que forram meu chão
Que mandam meus astros
E que diluem dentro de mim
As lonas do circo
Os tablados das construções
E os assoalhos do passado
Quase uma partitura
Quando durmo maestro
Quando acordo rio
Quando silencio um mar no peito
Guardo as pedras
Da calçada
Da rua de morar
Um menino de letreiros
Cheio de bilhetes
Com questões
Respostas vãs do mundo torto
A letra da futura carta
O carteiro da antiga
Aquela mulher feia da esquina
A pipa desequilibrada do vento
A pressa que não chega
O azeite quase virgem
A cama desfeita escondida
A estação desabitada da madrugada
O trem das cinco
O lanterninha de fazer cinema
A sala quadrada dos pares
A rampa da terra de porteiras
O esculacho da noite
Sou eu...
Simples e composto.


Casciano Lopes

18.11.11

Papo no ninho

Vestido de vinho

Primavera

Mandam dizer

No chão batido de criar filhos
No telhado seco de proteger
Há de brotar quem ande nos trilhos
Há de nascer o bem e depois crescer


Como a paz em formato de santos
Como o mar em ondas vestindo azul
Virá as santas rodando seus mantos
Virá do distante, do norte e do sul


O São Jorge e seu cavalo branco
O vento de mãos com a calmaria
Pai do negro e também do branco
Pai que senta pra conversar Maria


Enquanto amanhece no chão das almas
Enquanto embranquece os dias de luto
A sentença é lavrada e ditada nas palmas
A alegria esperada já come do fruto.


Casciano Lopes

17.11.11

A rua

Naquela pequena rua
Onde sobre cada casa
Caiu do céu
Um pedacinho de tinta
Onde cada tinta
Tingiu uma cor
E em cada cor
Se pintou um verso


Cresceu João
Namorou Antonia
Casou-se Joana
Fazendo meninos
Carlos, Caio, Clayton,
Clóvis, Cleber, Cláudio,
Somente os natos
E segue o time...


Tem os escalados
Também da reserva
Até os machucados
Nos tombos moleques
Em grosseiros tijolos
Feitos de grama
Com gol de brinquedo
Da pequena rua


Na rua lavada em biqueira
Goteira cai em estrofes
Deita-se na linha curva
Da rua seguida de perto
Por telhados avermelhados
De francesinhas
E paulistinhas
Uma cantiga de chuva


Enquanto via crescer meninos
Com suas Claras e Dolores
Vi pequena aquela rua
Que de miúda só tinha metros
De pobre só tinha as águas
Janelas e portas
De tricôs e bordados
De palpites e notícias


Enquanto o mundo crescia
Ali permanecia
O alfabeto
A tinta
A poesia
As cores vivas
Da pequena rua
De morar Marias.


Casciano Lopes



11.11.11

Tristeza do mapa

A água que descia era escassa.


A vermelhidão da infinita vista
Misturou-se a pele pálida e dura
Vincada, sulcada, rasgada em vales 
Resultando em um marrom tonel.


As ferpas de remendos do balaio
Serviam agora para coçar picadas
De venenos absorvidos como brasa
Da dor ausente que já não dói mais.


Os dentes se despediram dos lábios
Que rachados e tachados de um amarelo
Buscam inverno da janela e amordaçados
Salivam o que desce dos dias sertanejos.


Suor e saudade, guardados na lata vazia.




Casciano Lopes

Zig zig zá

A prece seguia junto com a multidão
O silêncio quebrado por um choro mais doído
Era acompanhado por ralentados soluços
E discretamente ritmados por passos lentos
Descompassados, às vezes, como embebedados
Por olhos lacrimejados da bebida de despedida
Seguia a prece que tecia o fim...
Findou a prece e o tempo dele,
Um novo tempo começou com menos um.


Casciano Lopes

10.11.11

Nego

Nego a dor que corta os pulsos
Que manifesta seu protesto indefeso.
Desconjuro a piedade porque mata
Mato o tempo porque também mata.
Julgo o nulo porque perde
Perco o muito que não abarco.
Chamo o que passa e vai surdo
Surdo fica o que é mudo.
Mudo fica o surdo destino
Nego o tudo pelo pouco.
Pego pouco o que preciso
Nego,nego, nego.
Cego que caminha
Corto moita que espinha.
Aparo vista iluminada,
Quebro lanternas e guias.
Sou louco?
Nego!


Casciano Lopes

Sem aplausos

Hoje me descobri
Sem elo, ele e eles
Assim...
Beijo sem face
Circo sem graça
Palhaço sem tintas
Padre sem fé no terço
Beato sem altar de reza
Sem lenço de choro
Sem corpo pro banho
Esfregão sem cabo
Sem ego, pupila e brilho
Sem água pro poço
Um sem platéia
Sem palco
Não posso...
Não posso.


Casciano Lopes

Canteiro de obras

Um grande homem é construído...
De pontes para ir e voltar
De curvas para se dobrar
De retas para enxergar horizontes
De paralelas para andar ao lado.


Um grande homem...
De chão pois é tudo que tem
De muros para proteção
De telhas para o silêncio
De tijolo pois ao barro torna.


É construção...
Civilização arquiteta
De mistura de materiais
Nobres e nem tanto
Novos e reciclados.


É homem...
É construção.


Casciano Lopes

9.11.11

Cuidado!!! É ele...

Vem  chegando de manso
Fingindo um descanso
Encosta no paletó
Na gravata faz nó
Fica a primeira noite
Desculpa-se no açoite
Nas paredes se ajeitando
Nos sofás se acomodando
Num dia como luz de repente
Toma de assalto o carente
Deixando doce na cama
O tal amor que já clama.


Casciano Lopes

8.11.11

Vizinhança

Acabei por descobrir que a saudade mora ao lado
Mas nem sempre tenho a chave da sua porta
Pois cada uma tem sua própria fechadura
E o chaveiro nem sempre é meu vizinho.


Casciano Lopes

Sequidão

O que cresce na mata de minha solidão
É a cor que já não brota demais
É a dor que já não colore mais
E o espinho da flor que morreu em vão.


Parecendo donos da sorte, na mata deste coração
Ervas daninhas, cactos, capins
De vez em quando parasitas e afins
Matando até raiz forte, é o que nasce desde então.


Na pequena floresta minha, feita de escuridão
Ora serrado de pampa, ora serrando rasteira
No meu deserto, ora seco, ora relva brejeira
Está cheio de hora sem hora... Senhora sem compaixão.


Casciano Lopes

Lição da montanha

Quando a vida da gente se perde numa montanha
E quando a água se mostra distante numa planície
A segurança corre longe das mãos do corpo bobo
O coração bambeia como numa corda sem nós
Que embala a chegada sempre incerta e só pergunta
Ao destino que áspero responde mergulhado no ar
Que montanhas e problemas só existem...
Para fazer caminhar meninos
Enquanto crescem na escalada
Descansando velhos na chegada
E morrendo sábios em seus topos.


Casciano Lopes

Três Pontas

7.11.11

Mistura fina

Sem boa notícia

Ela passou despercebida pela lente e sentou-se quieta
Despediu-se da luz de mais um dia e buscou conforto
Na pedra fria e úmida, resmungou um sono que não vinha
Enquanto as costas buscavam um calor que a consumisse
Em meio a pernas miúdas, possuía duas mãos trêmulas
Que discretamente, sentiam a caída da luz na brisa escura
Óculos passavam desatentos, enquanto avançava sua vontade
Que de comer, se transformou em de dormir, pois a de ser vista
De tão embaçada a visão, foi consumida pela noite gelada
E a tal criança pela madrugada analfabeta
Foi trucidada pelo inverno de um país
Pois seu jornal de cobertor, trouxe a previsão do tempo
Sem solução nas páginas.


Casciano Lopes

DEle, deles